quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Proseando...

Contos do céu e da neve. Parte IV. Parte final.


     O urso resolveu plantar uma semente de esperança no coração da pequena coruja em sua última despedida, achando que isto lhe faria mais animada. A esperança, de fato, é um sentimento muito forte, contudo, usado concomitantemente com uma mentira, pode ser cruel...

    A ave, entretanto, carregava em seu olhar de adeus a certeza de que nunca mais veria o seu grande amor. Sabia que aquele adeus era definitivo! Decidida estava de não mais regressar, pois, notara, era dona de uma felicidade incompleta e insuficiente para ela, afinal. Queria encontrar o contentamento pleno e deveria, então, procurar em outro lugar... Talvez mais perto de casa, certamente em outro olhar.

     Doloridamente fez da sua despedida de hoje, a última. Sabia que não mais valia insistir e não queria dificultar ainda mais as coisas para si mesma. Com um sorriso falso no rosto e uma última carícia das mãos felpudas do urso que tão grandes eram, quase a envolviam por completo, impulsionou-se no galho que sustentara tantas e tantas vezes esses dois seres da paradoxalidade.

     Mas isso era o que a coruja sabia: que era sua última despedida daquele gigante da neve que lhe aquecia o coração. O que ela não sabia é que esta seria a última despedida da sua vida. Não porque encontraria alguém do qual ela não mais precisaria se despedir. Quisera eu ter este final para lhe contar... O amor que a coruja teve pelo urso, todavia, terminaria em tragédia, bem como os maiores amores o são! E as lágrimas que embaçavam a visão da corujinha pelos ares ajudou este pequeno ser a não encarar o seu destino final.

     Quando a coruja começou o seu voo, não percebeu que suas asas estavam congeladas demais, machucadas demais para fazer a viagem completa. Ainda conseguiu, com muito esforço, alcançar o início da floresta. Estava tão desnorteada que acreditava que toda a sua dificuldade se dava por sua tristeza mórbida. Usava toda a força que possuía, mas que era insuficiente para manter seu corpo no ar.

     As asas pararam, afinal. Não mais batiam. Achou que era o seu coração. Fechou os olhos que nada viam e entregou-se à sua sorte. E, diferente do que a pequena ave pensava, seu coração atormentado ainda batia. Mas somente até o momento em que seu mergulho fatal chegou ao fim. Ao tocar sem nenhuma delicadeza o solo da floresta, suas asas congeladas se estilhaçaram no chão e por considerar que seu coração já estava em pedaços há tempos, a coruja sequer percebeu a dor da morte que, ao menos posso lhe dizer, foi instantânea.

     Este foi o fim da pequena ave: não mais visitou lugares gélidos e, tão pouco, voltou a alcançar a infinitude dos céus. Sequer pôde viver o grande amor que sempre sonhou... Talvez este tenha sido o fim que o destino traçou como o melhor para a corujinha, que já não teria forças para suportar outras angústias. Teve um encerramento cruel, mas que a livraria de todas as outras dores do amor. E, caso você não saiba - sinto ser eu a lhe dizer - este é o amor, afinal... Sempre há quem, de uma forma ou de outra, morra!