quarta-feira, 16 de março de 2016

Momento Poesia!

E quando dia estiver cinza
Use o seu azul e o tinja
Faça o que melhor faz
Colora tudo e um pouco mais

Use a sua melhor tinta
Aquela que nunca termina
Clareie de uma vez o dia
Feche os olhos e se divirta

Simplesmente sinta...
Talvez seja essa sua sina:
Fazer cantar o rouxinol
Fazer de dias de chuva, sol!


quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Proseando...

Contos do céu e da neve. Parte IV. Parte final.


     O urso resolveu plantar uma semente de esperança no coração da pequena coruja em sua última despedida, achando que isto lhe faria mais animada. A esperança, de fato, é um sentimento muito forte, contudo, usado concomitantemente com uma mentira, pode ser cruel...

    A ave, entretanto, carregava em seu olhar de adeus a certeza de que nunca mais veria o seu grande amor. Sabia que aquele adeus era definitivo! Decidida estava de não mais regressar, pois, notara, era dona de uma felicidade incompleta e insuficiente para ela, afinal. Queria encontrar o contentamento pleno e deveria, então, procurar em outro lugar... Talvez mais perto de casa, certamente em outro olhar.

     Doloridamente fez da sua despedida de hoje, a última. Sabia que não mais valia insistir e não queria dificultar ainda mais as coisas para si mesma. Com um sorriso falso no rosto e uma última carícia das mãos felpudas do urso que tão grandes eram, quase a envolviam por completo, impulsionou-se no galho que sustentara tantas e tantas vezes esses dois seres da paradoxalidade.

     Mas isso era o que a coruja sabia: que era sua última despedida daquele gigante da neve que lhe aquecia o coração. O que ela não sabia é que esta seria a última despedida da sua vida. Não porque encontraria alguém do qual ela não mais precisaria se despedir. Quisera eu ter este final para lhe contar... O amor que a coruja teve pelo urso, todavia, terminaria em tragédia, bem como os maiores amores o são! E as lágrimas que embaçavam a visão da corujinha pelos ares ajudou este pequeno ser a não encarar o seu destino final.

     Quando a coruja começou o seu voo, não percebeu que suas asas estavam congeladas demais, machucadas demais para fazer a viagem completa. Ainda conseguiu, com muito esforço, alcançar o início da floresta. Estava tão desnorteada que acreditava que toda a sua dificuldade se dava por sua tristeza mórbida. Usava toda a força que possuía, mas que era insuficiente para manter seu corpo no ar.

     As asas pararam, afinal. Não mais batiam. Achou que era o seu coração. Fechou os olhos que nada viam e entregou-se à sua sorte. E, diferente do que a pequena ave pensava, seu coração atormentado ainda batia. Mas somente até o momento em que seu mergulho fatal chegou ao fim. Ao tocar sem nenhuma delicadeza o solo da floresta, suas asas congeladas se estilhaçaram no chão e por considerar que seu coração já estava em pedaços há tempos, a coruja sequer percebeu a dor da morte que, ao menos posso lhe dizer, foi instantânea.

     Este foi o fim da pequena ave: não mais visitou lugares gélidos e, tão pouco, voltou a alcançar a infinitude dos céus. Sequer pôde viver o grande amor que sempre sonhou... Talvez este tenha sido o fim que o destino traçou como o melhor para a corujinha, que já não teria forças para suportar outras angústias. Teve um encerramento cruel, mas que a livraria de todas as outras dores do amor. E, caso você não saiba - sinto ser eu a lhe dizer - este é o amor, afinal... Sempre há quem, de uma forma ou de outra, morra!

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Proseando...


Contos do céu e da neve. Parte III

  
 Sim! A coruja e o urso estavam juntos, afinal. Dividindo o mesmíssimo espaço! Romperam a barreira entre o céu ilimitado e a terra gelificada. O que resultou em um novíssimo tipo de sorriso que sobressaltava na corujinha. Foi mesmo algo surpreendente que o gigante se despusesse a subir a árvore e tocar a face da pequena ave pela primeira vez, ela pensou. Quase não acreditara em sua sorte. Ela realmente não mais contava com isso.

   Neste momento, então, toda desesperança da ave foi substituída por um novo nível de amor, onde o seu pequeno coração ainda batia descontroladamente, mas, desta vez, de um nervosismo súbito. Ter alguém tão especial a tão curta distância causa inconsistências nas batidas cardíacas, como todos sabemos, principalmente a corujinha naquele momento.

   Tempos se passaram e a emoção permanecera a cada visita, sentimento este que a pequena ave foi se acostumando, de certa forma. Até por que, no decorrer dos dias, o momento onde os dois seres dividiam aquele galho mais grosso da mesma árvore foi se tornando corriqueiro, quase que ordinário... E esta foi a nova rotina da coruja, onde as visitas diárias permaneciam, mas o que diferia era em como, agora, era recebida.

   E assim seguiam seus dias: religiosamente na mesma jornada de encontrar com seu grande amor! Estar ali era tão importante que a fazia ultrapassar toda a dor que isto lhe causava, uma vez que era impossível não notar suas asas pesadas e quebradiças. Sem tempo para se recuperarem do congelamento que esta aventura frequente lhe causava, suas asas estavam cada vez mais danificadas. A coruja notava o que acontecia, porém ignorava!

   O tempo não parava, o ano corria e o inverno, naquele local, nunca passava. Os sacrifícios da coruja, entretanto, eram diários, e ela fez uma pergunta antiga e recorrente, questionando o gigante polar sobre a possibilidade de ele visitá-la vez ou outra na floresta. Ele sempre dissera que não poderia ir tão longe, que seu lugar era ali. Ali, né? Como se ela não tivesse um lugar para chamar de seu, mas que simplesmente resolvera abrir mão pouco a pouco a cada dia. Apesar de seu sofrimento interno, ela nunca quis que ele soubesse...

  O urso sempre desconversava, afinal. Mas os corações apaixonados são deveras tolos e não ouvem a uma palavra sequer da razão.  Mas a razão, neste dia, resolveu que era hora de gritar aos pés dos ouvidos da coruja e, desta vez, a pequena ave não pôde ignorar. Queria que o urso conhecesse mais da sua vida, queria que ele a entendesse de verdade. Ela era um pequeno e frágil ser que queria que o gigante observasse um pouco mais fundo e lhe amparasse e queria também que ao menos um dia não tivesse que expor suas penas ao frio extremo.

  A corujinha pensava que o amor seria capaz de equilibrar os sacrifícios, quando eles existissem. Mas, como constatamos, tolos são os corações apaixonados. Acreditam que sua devoção é sempre espelhada. E, depois de tudo o que fizera, a pequena ave percebeu que o urso não estava disposto a tanto. Que ele se contentara com a conversa em uma árvore fria e não havia a possibilidade que eles compartilhassem de fato, e até para sempre, um mesmo mundo.

    Sim... Ela sabia que era impossível. Mas considerava que o amor, sentimento forte como dizem, fazia morada nas impossibilidades e poderia romper qualquer barreira. E, afinal, eles não estavam tão próximos? Um ser dos céus, sem fronteiras, e um ser da neve, com uma imensidão nívea a desbravar, estavam ali, juntos, dividindo o mesmo local neste imenso mundo! Quão impossível teria sido? Resolveu, a coruja, que já havia chegado ao limite de suas próprias impossibilidades.

     No fim daquela tarde, como de costume, a corujinha despediu-se do urso. Ele notou um filete de tristeza em seu olhar e chegou a perguntar para a ave o que a afligia. Ela sorriu e disse: “Não é nada!” Frase tão conhecida por todos nós. Todos sabemos o que ela significa, de fato! Porém são poucos os que têm a coragem de se aprofundar nela. O urso não seria um deles... Não teria essa coragem! Despediu-se, apenas, da corujinha, pois sabia que ela retornaria no dia seguinte. Chegou a falar que marcariam a data para ele visitá-la na floresta!


     Não há final feliz por aqui, como você bem sabe! Estaríamos cometendo um grande erro se desejássemos por isso, afinal não existe uma gota sequer de felicidade alicerçada por uma mentira, e tanto a ave quanto o urso sabiam que não havia qualquer pincelada de verdade na promessa feita à pequena, e novamente maltratada, coruja.